22 novembro 2007

A GRATIDÃO E O APERREIO

O apóstolo Paulo fala aos Tessalonicenses que eles devem "em tudo dar graças, pois esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus" (1 Ts. 5:12-18). Algo nessa instrução de cunho prático, direcionada ao povo de Deus em Tessalôniaca é, no mínimo, desafiador: a expressão "em tudo". À luz de outros escritos de Paulo, sabemos que esse "tudo" referido compreende abundância, mas também escassez; fartura de comida, mas também fome severa; situações de paz, mas também de acirrada perseguição; momentos de aceitação, mas também de violenta repulsa. Enfim, é o "tudo" que conhece, de modo prático-vivencial, as alegrias e os dissabores da vida.

Gratidão quando tudo parece estar certo, quando o sonho se realiza e quando a conta bancária reflete o "azul da cor do céu" é fácil. Contudo, ao sermos desafiados à gratidão diante desse "tudo" (que inclui também os momentos de derrota, do sonho irrealizado e da conta "avermelhada"), uma sensação de constrangimento ou, até mesmo, de contra-senso, paira irrefutável diante de nós. "Como é possível ser grato na doença, na fome, frente a uma aflição ou a uma derrota desmerecida?" Acredito que essa dúvida e o aparente contra-senso brotam a partir de uma má compreensão do que vem a ser gratidão. Permita-me expor, então, o que NÃO é gratidão.

Ser grato em meio a lutas NÃO é um (1) conformismo passivo que olha para a desgraça e diz (ou pensa): "Era da vontade de Deus mesmo, fazer o quê?" Essa postura resignada produz um cristianismo sem sal e descansado, que não luta por transformação, nem repudia as injustiças da vida. Também NÃO é uma (2) alienação da realidade que finge que a crise não existe. A alienação prefere não enxergar as coisas como de fato são para criar um mundo paralelo aonde tudo vai bem. Oposta a essa realidade é a reação da criança que, no auge de sua sinceridade, ora pelo almoço e diz: "Papai do céu, eu te agradeço por essa comida, menos por esta cenoura que eu detesto!". Por fim, estar grato quando tudo dá errado, NÃO é uma
(3) ferramenta de manipulação do favor de Deus que diz: "Vou agradecer por essa tribulação para que Deus, agradando-se da minha oração, mude o quadro". Essa postura reflete uma espiritualidade equivocada e imatura que acha que reclamar muito atrai coisas ruins; e esquece que Deus está mais interessado na sinceridade do coração que sofre e, em momentos, externa sua frustração diante dEle, do que na imagem projetada do cristão que vive sorrindo diante da desgraça.

Gratidão é, tão somente, a postura de alguém que reconhece e aceita o cuidado de Deus (bom, perfeito e agradável) em sua vida. Para tanto, se farão necessárias a fé e a confiança de que esse Deus, eterno em bondade e misericórdia, há de suprir todas as nossas necessidades, a seu tempo e a seu modo.

Quando as privações vêm, sou grato(a) a Deus pela convicção que Ele, em meio às lutas, haja o que houver, está cuidando da minha vida.

1 Comments:

Blogger Zeze Medeiros said...

Ah! As sábias palavras de São Paulo, definitivamente é meu predileto entre os escritores da Bíblia. Sabe, eu nunca gostei muito dessa tendência cristã ocidental fatalista de "é-isso-mesmo", deve ser a influência marxista que me impulsiona a acreditar que fazemos a hora e que a acomodação às vicissitudes da vida pode ser danosa à natureza humana.
Pax et Bonum

5:09 PM  

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