POR QUE DEBOCHAM DE NÓS?
Encontrei-me em uma padaria da cidade com um antigo vizinho. Naquela conversa, tipo "atualização de dados", ele perguntou: "O que você está fazendo hoje?" Ao responder que era pastor, ele esboçou um olhar meio desconfiado / decepcionado e completou: "Mas você não está envolvido nessa palhaçada que se ouve e se vê nas televisões e rádios não, né?"
"Bem, acho que não!", respondi. Mas o que eu ouvi de fato o meu ex-vizinho dizer, e que muito me incomodou, foi mais ou menos o seguinte: "Se vocês afirmam que a mensagem de Cristo é tão libertadora e transformadora, como vocês, evangélicos, se multiplicam no país, mas praticamente não se vê libertação ou transformação no nosso sistema de leis, nos bastidores das instituições públicas, no caos da vida urbana, na violência desmedida, na casa da Dna. Maria que tem seis filhos, um marido alcoolatra e faz milagre para sobreviver com meio salário mínimo das roupas que lava?"
No imperdível livro "A igreja do outro lado", Brian McLaren reconhece de maneira bem indigesta, mas não menos sincera, sobre onde podemos ter perdido o foco da mensagem transformadora de Jesus:
"Perdemos a salinidade, e como disse Jesus: 'para nada servimos senão para sermos jogados fora e pisados (debochados) pelos homens'. (Mt. 5:13). Em certo sentido temos sido pisados." Senti-me "pisado" pelo desdém do ex-vizinho! "Merecemos ser pisados quando declaramos uma fé de tanto poder e mostramos tão pouco dele em nossas vidas." "Sim, tenho consciência do 'poder do evangelismo', dos 'encontros poderosos', dos 'reavivamentos do riso' e tudo o mais. Eles têm o seu lugar, mas o poder que ansiamos ver não é tanto uma questão de chacoalhar os braços de uma pessoa, de emoção ou de aparato vocal, mas sim o poder de chacoalhar o nosso egoísmo, a nossa intolerância, nosso preconceito, nossa preguiça e nosso medo. Estou esperando por um encontro de poder que resulte não apenas no falar em línguas, mas em um dízimo fiel; não apenas no anelo pela cura física, mas no esforço pela cura social; não apenas nas manifestações emocionais, mas em uma arte melhor, em uma ecologia melhor e em pessoas mais prestativas. Isso para mim a essa altura seria miraculoso o bastante".